sexta-feira, 24 de outubro de 2008

ME investe em estádio e abre precedente


LEANDRO CARNEIRO
Da Máquina do Esporte, em São Paulo

Recém-comprado pela Prefeitura de Araraquara, o estádio da Fonte Luminosa começou suas reformas recentemente. As verbas para as mudanças, porém, não serão apenas do poder municipal. Em iniciativa que já funciona como precedente para outras praças esportivas, o Ministério do Esporte injetou R$ 11 milhões na obra, que pode ser "copiada" por Rio Claro.

"Quando adquirimos o estádio, fizemos um projeto que foi aprovado pelo ministério, e conseguimos o auxílio federal. O trabalho é feito como um convênio para investimento nos estádios do Brasil", afirmou Manuel Sobrinho, secretário do Esporte de Araraquara.

O processo começou quando a Fonte Luminosa, que era do setor privado, foi a leilão. Para evitar a derrocada do estádio, a Prefeitura gastou R$ 4 milhões na compra, e mais R$ 7 milhões para a reforma, ao lado do Ministério do Esporte.

O problema é que a iniciativa da pasta de Orlando Silva Jr. não está incluída em nenhum programa do governo, e faz parte, segundo a assessoria de imprensa do órgão, das obras de infra-estrutura realizadas pelo ministério. Por isso, não estariam incluídos no portal "Transparência Pública" do site oficial da pasta.

O apoio federal, então, poderia se estender a outros inúmeros exemplos em todo o país que não foram contemplados. Animada com a possibilidade, a Prefeitura de Rio Claro, em parceria com o clube homônimo, enviou um projeto para o Ministério do Esporte com o orçamento de R$ 18 milhões para a reforma do estádio Augusto Schmidt Filho, o Schmidtão.

"Acreditamos que nosso projeto vai sair também. Estamos pleiteando recursos do Governo Federal para um plano semelhante ao que está sendo feito em Araraquara", afirmou Dirce Abreu, responsável pelo marketing do Rio Claro na comemoração do centenário.

A intenção dos diretores do clube do interior paulista é realizar um projeto nos mesmos moldes de Araraquara. O pedido aguarda, no momento, uma resposta do Ministério do Esporte. A assessoria de imprensa da pasta disse desconhecer a possibilidade.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Rio-16 custa mais de R$ 100 mi à União


REDAÇÃO
Da Máquina do Esporte, em São Paulo

A candidatura do Rio de Janeiro para sediar os Jogos Olímpicos de 2016 é a mais cara já promovida pelo Brasil. Segundo a edição desta segunda-feira do jornal "Folha de S.Paulo", o governo federal irá investir mais de R$ 100 milhões na postulação da cidade, sendo que R$ 80 milhões foram injetados neste ano.

Apenas em salários, o projeto consome cerca de R$ 450 mil mensais dos cofres públicos. O dinheiro é destinado aos 46 funcionários que já trabalham na candidatura carioca. Ainda há outros 22 profissionais à disposição do comitê, mas alguns, como o secretário-geral Carlos Roberto Osório, não são remunerados.

Na comissão de candidatura, ainda de acordo com a "Folha", existem outros gastos, com manutenção e tecnologia, por exemplo. Todas as despesas serão bancadas pela União, Prefeitura do Rio de Janeiro e setor privado, diz o Ministério do Esporte. Mas até agora a previsão é de que os maiores aportes sejam de responsabilidade do governo federal.

Só para os pagamentos dos funcionários a União liberou R$ 877 mil para o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) em um convênio datado de agosto deste ano. O comitê entrou com uma contrapartida de R$ 13,4 mil. O montante é de R$ 890 mil, fora os encargos com direitos trabalhistas, que acrescentam 70% à folha salarial.

A média dos vencimentos mensais dos funcionários ligados ao projeto olímpico é de R$ 5,7 mil, conforme o cálculo do jornal. O grupo ainda deve ser ampliado nos próximos meses, que serão definitivos para as pretensões do Rio. A cidade vencedora será anunciada em outubro do ano que vem.

Além do Rio, estão na disputa Chicago (Estados Unidos), Madri (Espanha) e Tóquio (Japão). O país tentou sediar os Jogos nas edições de 2000 (Sydney foi a escolhida), 2004 (Atenas) e 2012 (Londres).

A ideologia do esporte-espetáculo e suas vítimas

Le Monde Diplomatique


Transmitido mundialmente pela televisão, o esporte tornou-se um dos vetores da globalização. Sua ideologia disfarça seu caráter político, a monetarização generalizada dos “valores” esportivos, fraudes e trapaças de todos os tipos e, sobretudo, ’doping’ maciço em todos os estágios


Jean-Marie Brohm, Marc Perelman, Patrick Vassort


A globalização do esporte, iniciada verdadeiramente a partir da II Guerra Mundial com a multiplicação sem fim das competições, duplicou-se com uma “esportivização” do mundo como vetor político-ideológico comum ao conjunto das potências financeiras que submetem o planeta à sua imposição. Depois que o barão Pierre de Coubertin lançou o movimento irresistível de propagação esportiva, ao ressuscitar os Jogos Olímpicos em Atenas, em 1896, o fenômeno esportivo caracterizou-se pela combinação de vários fatores: um desenvolvimento sem precedentes da maioria dos esportes em todo o planeta, sua homogeneização internacional pela codificação de regras unificadas, e o desaparecimento progressivo das técnicas corporais ou dos jogos típicos dos países.

O espaço público, reduzido a uma tela de sonho televisionado, está saturado de esporte, a tal ponto de comprometimento que a política é considerada, também ela, como um esporte

A unidade desse conjunto reconfigurou simultaneamente o tempo do mundo (estabelecimento de calendários competitivos cada vez mais apertados, servindo de referências aceitas por todos) e o espaço geopolítico (multiplicação de locais de esporte: junto dos edifícios, nos estádios, em casa diante da televisão, no meio do mato), e tudo isso num espetáculo transmitido mundialmente pela televisão. Até parece surgir dessa articulação inédita do tempo e do espaço uma nova história, formada pelas façanhas, os recordes, os desempenhos, criando, por isso mesmo, mitos e “lendas fabulosas”, dos quais os campeões seriam os deuses, no meio de um oceano de imagens.

Pandemia esportiva

Essa pandemia esportiva – a extensão de sua esfera de influência no interior da vida diária – é, de fato, perceptível na globalização do esporte enquanto universo implacável de “ganhadores”, eventualmente demolidores. O espaço público, reduzido a uma tela de sonho televisionado, está saturado de esporte, a tal ponto de comprometimento que a política, por exemplo, é considerada, também ela, como um esporte. O tifo esportivo contaminou as consciências com uma velocidade incrível, fazendo de cada indivíduo um torcedor em potencial. A ponto de o esporte ser atualmente exercido no mesmo registro que as necessidades – beber, comer ou dormir – e ter se tornado o espaço-tempo quase que exclusivo dessas multidões solitárias, imbecilizadas pela paixão pelo não essencial: um chute a gol, um sprint ou uma quebra de serviço. O esporte é a vida diária e, para muitos indivíduos, não há mais nada fora dele, a não ser o vazio abissal do jargão, televisivo, da inautenticidade.

Se os estádios permitem o exercício efetivo da competição, o verdadeiro fascínio pelo espetáculo que se apodera das multidões seduzidas é o resultado precisamente do poder, ao mesmo tempo banalizado e hipnótico, da retransmissão generalizada das competições – de um único ponto do mundo, o estádio, para todos os pontos possíveis, para cada casa – e de acordo com uma transmissão que lhes é própria: ao vivo, o instantâneo, em câmara lenta e a repetição de todos os ângulos, em cadeia.

Por seu próprio modo de manifestação, o esporte tornou-se um dos vetores da globalização em curso, ou seja, uma espacialização planetária sob o regime de um tempo único reificado, literalmente coagulado, constituído pelo poder universal da divulgação televisiva. O tempo ainda marcado pela historicidade, um tempo complexo, de uma certa fluidez dialética1 , foi substituído, portanto, pelo tempo do esporte, que divide a história ao ritmo das competições, dos recordes, das teletransmissões. O esporte “realmente existente” não é senão um frenesi de competições, a organização planetária de sua rotação permanente num calendário universal. Atualmente, o esporte não é mais do que um dos componentes de um tempo e de um espaço autonomizados no e pelo capital. Ele é a tomada de posse do tempo e do espaço à sua imagem e como imagem.

Vedetes do esporte

Novas estrelas da globalização, os campeões tomaram o lugar das vedetes do cinema e do show business. O esportista de alto nível tornou-se o modelo publicitário a ser seguido

Novas estrelas da globalização, os campeões tomaram o lugar das vedetes do cinema e do show business. O esportista de alto nível tornou-se o modelo publicitário a ser seguido, com quem a juventude deve se identificar. Não somente os patrocinadores constroem a imagem dos esportistas como produtos globalizados padrão, mas a globalização veicula as figuras planetárias de esportistas uniformizados à imagem de seus calçados: a língua comum deles é o jargão anglo-esportivo, seu modo de vida é homogeneizado – mesmas “bebidas energizantes”, mesmos hotéis de luxo, mesmas paixões por carros potentes, mesmos treinamentos dementes, mesmos dopings, mesmo interesse pelas contas bancárias.

Contratados por times, escuderias ou equipes controladas por interesses financeiros poderosos, esses happy few dedicam seu tempo a encontros em torno do globo terrestre, apresentando-se em espetáculo diante de uma imensa platéia de deserdados e de oprimidos, reduzidos a serem apenas telespectadores fanatizados ou máquina de aplaudir, como nos reality shows.

O poder efetivo da ideologia do esporte é o resultado da multiplicação infinita das imagens da competição sem outra mediação que não sejam comentários redundantes de uma aflitiva banalidade. A globalização televisiva permanente transforma então a paixão esportiva em paixão pela imagem, em “iconomania”, para retomar o conceito de Günther Anders2 . A contaminação geral das consciências provém, portanto, dessa intoxicação esportivo-televisiva incessante. Esta última, por meio da série de imagens infinita imposta pelas tecnologias digitais, que prendem cada indivíduo diante de suas telas (telão, telefone celular, home vídeo, televisor, etc.), celebra não somente os novos ícones do esporte, mas distila de forma maciça a visão esportiva do mundo.

O caráter político do esporte

“A ideologia”, diz Engels, “é um processo desempenhado pelo pretenso pensador provavelmente com consciência, mas com uma falsa consciência. As forças motrizes verdadeiras que o põem em movimento permanecem desconhecidas para ele, pois se não fosse assim, não seria um processo ideológico. Ele imagina também forças motrizes falsas ou aparentes3 .” É dessa forma que a ideologia esportiva põe em prática a ação imaginária de hipóstases imaginárias (a idéia olímpica, a paz olímpica, o fair-play, o espírito esportivo etc.) desconhecendo, disfarçando ou recalcando as forças motrizes reais do esporte: o acúmulo do capital esportivo, a corrida desenfreada ao bom rendimento, os efeitos deletérios da competição.

A ideologia da “neutralidade axiológica” nega ferozmente o papel do esporte enquanto parte de um projeto de embrutecimento, de doutrinação e de cloroformização das massas

A primeira forma de falsa consciência que distingue essa Disneylândia, enquanto aparelho ideológico, é a denegação de qualquer caráter ideológico, o bloqueio político de qualquer caráter político do esporte.

De maneira ingênua, entre os praticantes e dirigentes esportivos imersos nesse oceano onírico ao mesmo tempo narcisista e megalomaníaco, ou de maneira mais perversa, entre certos intelectuais, o esporte é apresentado como um culto da performance, uma contra-sociedade do esforço competitivo, um universo encantado e encantador de práticas da superação de si mesmo que nada teriam a ver com as oposições ideológicas, as orientações políticas, as convicções religiosas. O esporte seria fundamentalmente neutro, apolítico, fora da luta de classes, nem à esquerda nem à direita, nem mesmo no centro, acima das querelas partidárias e dos conflitos sociais.

A ideologia da neutralidade

A ideologia da “neutralidade axiológica” nega ferozmente o papel do esporte enquanto parte de um projeto de embrutecimento, de doutrinação e de cloroformização das massas – tanto nas metrópoles imperialistas quanto no Terceiro Mundo. Ela se expressa sob duas formas essenciais, que não se terá nenhuma dificuldade em reconhecer por ocasião dos próximos jogos, em Atenas.

A primeira, veiculada com insistência por todas as tendências de esquerda, consiste em defender que o esporte pode assumir todas as cores, do vermelho vivo ao rosa pálido. Organizado de maneira “progressista”, o esporte poderia contribuir, por exemplo, para a emancipação das mulheres, combater o racismo e a xenofobia, contribuir para a integração republicana, relançar a mobilidade social e, para terminar, promover a “cultura”. Haveria, dessa forma, um esporte verdadeiro, um esporte educativo, um esporte purificado, um esporte com cara humana, em suma, uma Essência ou Idéia platônica do esporte que se oporia aos lamentáveis excessos, abusos, vícios e desvios do esporte realmente existente. A realidade bastante sórdida das negociatas, do doping, dos resultados combinados e da corrupção encarrega-se, é claro, de corrigir periodicamente esses mercadores de ilusões.

A segunda expressão da ideologia da neutralidade ideológica, ainda mais maciça, reconstitui-se periodicamente nas aclamações unanimistas do “consenso esportivo”. O gregarismo, a massificação, a mobilização total, senão totalitária, das multidões que os feitos fabulosos dos deuses do estádio fazem “vibrar de felicidade” – como ainda recentemente, por exemplo, a vitória da Tunísia na Copa da África de futebol – supostamente provam o universalismo do “ideal esportivo” ou da “idéia olímpica”. É bastante constrangedor, portanto, ver intelectuais, em geral mais críticos, juntarem-se à matilha dos fanáticos por músculos, incapazes de explicitar as funções políticas reacionárias dessa esportivização das mentes, dessa intoxicação emocional fictícia em torno de “nossos” campeões.

Cretinização populista

A realidade bastante sórdida das negociatas, do doping, dos resultados combinados e da corrupção encarrega-se, é claro, de corrigir periodicamente esses mercadores de ilusões

Nos êxtases nacionais – até há quem fale de orgasmo – que saturam o espaço público em caso de vitória, os amigos do esporte gostaram, portanto, de reconhecer a manifestação de uma união sagrada regeneradora. Os campeões seriam, então, a vanguarda de uma sociedade reconciliada consigo mesma. A vitória da seleção da França “black-blanc-beur” [negro-branco-árabe] por ocasião da Copa do Mundo de futebol de 1998 foi o momento de uma onda impetuosa de cretinização populista.

Didier Deschamps, capitão do time francês, afirmou, sem sequer sorrir, que “o futebol é um vetor que permite apagar as diferenças raciais, sociais ou políticas4 ”. O treinador Aimé Jacquet era ainda mais lírico: “A França reconheceu-se através desse time multiétnico. O fato desses jovens, nascidos na França, cheios de alegria de viver e de ambição, terem feito tanta gente feliz é muito positivo para o país. Penso que isso pode dar um bom impulso à unidade nacional5 ”. O editorialista do jornal L’Humanité desenvolvia a metáfora da “lenda do século”: “Os ídolos azuis entraram na eternidade brilhante do futebol6 ”. Portanto não é surpreendente que Zinédine Zidane tenha sido escolhido o “francês preferido dos franceses” e que os mais dependentes do ópio esportivo até tenham imaginado “Zidane presidente”!

Essa demagogia unanimista, no entanto, não resistiu por muito tempo ao princípio de realidade: nem o “futebol dos conjuntos habitacionais”, nem o “futebol de rua”, nem o “esporte popular”, nem o “esporte para todos” – esses aspectos enganadores de um desejo apaixonado – impediram que se agravassem a “fratura social” e o contínuo desaparecimento do vínculo coletivo nos “bairros difíceis”. Em vez de cooperar para a concórdia civil, os encontros esportivos são cada vez mais semeados de incidentes graves e de violência raivosa, que não são simples “excessos” ou “ocorrências policiais”, mas a conseqüência da vitória a qualquer preço que prevalece em todos os escalões da instituição. A selva esportiva, aliás, não faz mais do que refletir aqui seu alter ego: a selva da globalização liberal.

A violência e a corrupção

A vitória da seleção da França “black-blanc-beur” [negro-branco-árabe] na Copa do Mundo de futebol de 1998 foi o momento de uma onda impetuosa de cretinização populista

O segundo processo ideológico é a expressão da dissociação quase esquizofrênica existente entre os discursos oficiais – que reforçam, a seu modo, os produtores da boa consciência esportiva7 – e as tristes evidências do “meio”: aumento e agravamento da violência dentro e fora dos estádios, escândalos repetidos de corrupção mafiosa ou semi-mafiosa, monetarização generalizada dos “valores” esportivos, fraudes e trapaças de todos os tipos e, sobretudo, doping maciço em todos os estágios.

Segundo a boa velha lógica da separação esquizóide, assiste-se então a uma dupla dissociação: a instituição esportiva é inicialmente considerada como sendo independente da sociedade capitalista global e podendo desenvolver uma lógica autônoma. Numa sociedade gangrenada para caça ao lucro, o esporte seria, então, capaz de permanecer uma pequena ilha “pura” protegida por seus “valores”. A instituição esportiva é em seguida considerada como sendo dividida de acordo com a lógica binária do “bom esporte” – oposto a seus “maus usos”, seus “desvios” e suas “desfigurações”. Nesse sentido, o doping só seria um epifenômeno lamentável que “desvia”, é evidente, a ética do esporte, mas que só seria uma prática limitada a alguns raros trapaceiros em alguns determinados esportes.

Avalanche de doping

Ora, os acontecimentos destes últimos quinze anos mostraram claramente que o doping, mais do que uma transgressão episódica, é o revelador teratológico da natureza exata do esporte: uma corrida irreversível às manipulações bioquímicas, uma “antropomaximologia”, como diziam recentemente os teóricos soviéticos, um projeto totalitário que visa submeter o ser humano à fabricação de um “cibernantropo” ou de um ser biônico de tipo novo. Investigações, processos, confissões e revelações acabaram, portanto, por desvendar a verdadeira face da competição.

Numa sociedade gangrenada para caça ao lucro, o esporte seria, então, capaz de permanecer uma pequena ilha “pura” protegida por seus “valores”

A avalanche de casos de doping no ciclismo e no atletismo, mas também no futebol ou na natação, depois dos casos já antigos do halterofilismo, do esqui e do remo, teve como resultado pôr sob vigilância todas as disciplinas, apanhadas umas depois das outras em casos de doping (inclusive o rúgbi, a esgrima, o judô, a luta livre e o tênis...). Sobretudo tais casos voltaram a fazer a pergunta lancinante das condições médicas efetivas nas quais se realiza hoje a performance. A multiplicação dos treinamentos e das competições, o aumento da carga de trabalho ligada à elevação constante das exigências do alto nível, a intensificação dos compromissos financeiros e a pressão da mídia transformaram definitivamente o doping artesanal numa indústria multinacional, com seus fornecedores, seus setores, seus intermediários8 .

Enquanto a lista dos controles positivos aumenta – e isto ocorre em todos os níveis da competição –, os dirigentes fingem descobrir a extensão da praga. Depois de cada Volta à França ou à Itália, o ciclismo promete voltar a se tornar “limpo”, na espera de ser atingido por um novo caso. Nos outros esportes, só algumas ovelhas negras isoladas, ao que parece, recorreriam às substâncias proibidas e ainda de forma intermitente!

O eufemismo do inominável

Como cúmulo da falsa consciência, os mais lúcidos, ou os mais cínicos, consentem em maquiar o doping com uma forma de eufemismo: os complementos vitamínicos, a alimentação enriquecida, o reequilíbrio hormonal, a reoxigenação, as medicações contra a asma, os tônicos musculares, a creatina e outros estimulantes do esforço servem para evocar pudicamente o inominável das injeções e das anfetaminas, a administração dos diversos anabolizantes e corticóides, as transfusões de sangue em altas doses, o hábito dos tratamentos com EPO9 e agora com THG10 .

Quando raros esportistas de renome são apanhados, como o cubano Sotomayor (salto em altura), os ingleses Christie e Chambers (velocistas) ou o austríaco Schönfelder (esqui), finge-se acreditar que são simples “casos isolados”. Mas são só a ponta aparente de um imenso iceberg. Os outros ficam sem opção: ou aceitam, mais ou menos voluntariamente, recorrer aos “coadjuvantes” da performance, ou desistem de jogar do lado dos grandes. Caso não se tratasse de um problema de saúde pública, poder-se-ia falar aqui, por brincadeira, de “fratura esportiva” entre aqueles que já aderem à mega seita da dependência e aqueles que esperam fazer parte dela.

Quando raros esportistas de renome são apanhados, como o cubano Sotomayor, os ingleses Christie e Chambers, finge-se acreditar que são simples “casos isolados”

Matam-se cavalos, de fato; então, pouco importa que muitos esportistas sejam agora ceifados na flor da idade, de “morte natural”, como dizem comunicados eufemísticos11 , ou vítimas da toxicomania como Pantani, Maradona e tantos outros que durante muito tempo foram apresentados como “modelos para a juventude”. E enquanto a Agência Mundial Antidoping (AMA) multiplica sua gesticulação, as leis antidoping timidamente em vigor em certos países (dentre os quais a França) revelam sua dramática impotência e os organismos esportivos, sua negligência, para não dizer sua condescendência culpada, diante dessa hecatombe programada.

Ocultação do real

No entanto, persiste-se em celebrar o que não existe, para melhor calar o que existe. Da mesma forma que o “ideal comunista” durante muito tempo impediu os militantes de reconhecerem a verdade evidente dos crimes do socialismo realmente existente, cegando-os em sua cegueira, o “ideal esportivo” ou a “idéia olímpica” – segundo a fraseologia ritual no universo da publicidade esportiva da mídia – contribuem maciçamente para ocultar as condições reais da prática esportiva de competição. Da mesma maneira que recentemente era preciso não “desesperar” a potência operária de Billancourt, é preciso não desencorajar as hordas de enganados que correm o risco de serem dopados. The show must go on...

O terceiro processo ideológico diz respeito à visão esportiva do mundo enquanto conjunto de discursos performativos12 . Na verdade, a lei esportiva tem como função essencial manter a pureza do dogma atlético, o caráter imaculado do mito olímpico. É em nome dessa ilusória “idéia esportiva” que numerosos ideólogos propõem restaurar os valores que o meio seria encarregado de exaltar. Ora, além do fato de que o altruísmo nunca foi mais do que um mito idealista, é precisamente em nome desse suposto altruísmo que a competição esportiva se colocou, desde sempre, a serviço de interesses econômicos, políticos e ideológicos que, quanto a eles, são bem reais.

Ao invocar de maneira quase mística os “valores eternos do esporte”, essa ideologia procura ser cumprida como profecia auto-realizadora, reduzindo o abismo existente entre a realidade mundana da prática efetiva do esporte-espetáculo capitalista e a esfera celeste da “idéia esportiva”. À maneira de um imperativo categórico, ela tenta adaptar os costumes pouco brilhantes a um ideal idolatrado, do qual Coubertin foi o grande sacerdote. Os artigos da seita esportiva – fair play, respeito pelo adversário, trégua olímpica, amizade entre os povos, festa da juventude, etc. – cantados em prosa e verso, são encontrados há anos em falsas associações: entre o esporte e a cultura, o esporte e a paz, o esporte e a democracia, o esporte e a emancipação dos povos, os deserdados e as mulheres, o esporte e o respeito pelo meio ambiente etc.

Propaganda para regimes perversos

Pouco importa que muitos esportistas sejam agora ceifados na flor da idade, de “morte natural”, ou vítimas da toxicomania como Maradona

Por uma série de equações perversas, a ideologia esportiva ousa até identificar o ideal à sua negação pura e simples. Foi dessa forma que, na Argentina, a “liberdade de jogar”, comemorada em 1978 por todos os amadores do esporte bretão, foi, sobretudo, uma operação de propaganda em favor da ditadura fascista de Jorge Rafael Videla, avalizada pela Federação Internacional de Futebol (Fifa) e todos os torcedores do fato consumado.

Da mesma forma, foi em nome do “ideal olímpico” que aconteceram os Jogos da cruz gamada em Berlim, em 1936, os Jogos stalinistas de 1980, em Moscou, os Jogos policiais de Seul, em 1988. E será ainda à “fraternidade olímpica” que Atenas dedicará, em agosto de 2004, a reunião “pacífica” de uma interminável corte de “Estados delinqüentes”, ditaduras de republiquetas e regimes policiais que procurarão conseguir medalhas, honras e considerações, sob a proteção cerrada de milhares de militares e agentes dos serviços de segurança, mobilizados para prevenir atentados terroristas.

Atenas – que, na Antigüidade foi o berço da filosofia e da democracia – passará em seguida a tocha olímpica a Pequim, símbolo sinistro do despotismo oriental. Os incensadores do esporte então fecharão os olhos pudicamente às violações maciças dos direitos humanos na China, com a única finalidade de preservar o “sucesso” da festa olímpica em 2008. Serão esquecidos os campos de trabalhos forçados, as mentiras de Estado, a ocupação do Tibete, a repressão sangrenta da praça Tienanmen, as execuções públicas dos condenados à morte, as extorsões da polícia política, as ameaças contra Taiwan, a normalização de Hong Kong. As festividades olímpicas servirão, uma vez mais, de biombo a um exercício de propaganda para um regime totalitário. E a fraseologia esportiva, com seu humanismo falso, servirá de justificativa a uma operação de marketing político para a burocracia chinesa. Como de hábito, a “finalidade sem fim” do esporte legitimará o monopólio da violência ilegítima de uma tirania.

(Trad.: Regina Salgado Campos)

1 - Ler, de Walter Benjamin, “Sur le concept d’histoire”, Oeuvres, ed. Gallimard, 2000, vol. III.
2 - Ler, de Günther Anders, L’Obselescence de l’homme, ed. Ivrea/L’Encyclopédie des nuisances, 2002.
3 - Ler, de Friedrich Engels, “Lettre à Franz Mehring, 14 juillet 1893”, in Œuvres choisies, de Karl Marx e Friedrich Engels, Editions du Progrès, Moscou, 1955, vol. II, pp. 545-546.
4 - Le Monde, 14 de julho de 1998.
5 - Le Monde, 18 de julho de 1998.
6 - Claude Cabanes, L’Humanité, 13 de julho de 1998.
7 - Para a crítica dos “humanistas do esporte”, ler, de Jean-Marie Brohm e Marc Perelman, Le Football, une peste émotionnelle; de Marc Perelman, Les Intellectuels et le football; e, de Patrick Vassort, Football et politique, todos os três publicados em 2002 pelas Editions de la Passion (Paris).
8 - “L’industrie florissante du dopage”, Capital, n° 118, julho de 2001.
9 - EPO é a eritropoietina, um hormônio produzido pelos rins para regular o número de glóbulos vermelhos no sangue. Utilizada em quantidades até cem vezes superiores à normal, a droga melhora a oxigenação dos músculos e evita o cansaço.
10 - Novo esteróide descoberto em 2003.
11 - “Muitos esportistas de alto nível faleceram brutalmente nestes últimos meses. As autópsias realizadas concluíram serem ‘mortes naturais’, uma explicação considerada ‘insuportável’ pelo professor Jean-Paul Escande, ex-presidente da comissão nacional de luta antidoping”, Le Monde, 2 de março de 2004.
12 - Ler, de John Langshaw Austin, Quand dire, c’est faire, Paris, ed. Seuil, 1970; e, de John R. Searle, Les Actes de langage. Essai de philosophie du langage, Paris, ed. Hermann, 1972.

Futebol, tráfico de atletas e conivência do Estado

Dez anos após a aprovação da Lei Pelé, Executivo e Congresso finalmente estudam medidas para coibir a evasão clandestina de jogadores. Mas, influenciadas pela lógica de mercado e pelo desejo de satisfazer os clubes, as propostas em debate podem agravar o problema, ao invés de saná-lo


Alexandre Machado Rosa

Em março último, sob pressão de denúncias na imprensa, o Congresso Nacional voltou a debater medidas para limitar a transferência ao exterior (muitas vezes sob forma de tráfico) de atletas de futebol. O fenômeno cresce a cada dia, desde a aprovação da Lei 8615/98, a chamada “Lei Pelé”. Acompanhado de dirigentes de clubes, o ministro do Esporte, Orlando Silva, compareceu à Câmara dos Deputados e pediu que sejam acelerados os trâmites para efetivar as mudanças. A intenção é bem-vinda mas o caráter das propostas, não. Governo e Congresso querem, essencialmente, antecipar a idade a partir da qual os jovens jogadores podem vincular-se – assumindo contratos de trabalho de caráter mercantil – com os clubes brasileiros. Neste afã, atenta-se contra o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Seria perfeitamente possível enfrentar o problema de outra maneira — como fazem, aliás, outros países. Para tanto, o Estado precisaria, ao invés de reforçar relações de clientelismo com os clubes e seus “cartolas”, assumir seu papel de criador de mecanismos de proteção social.

Assunto de numerosas matérias jornalísticas, o êxodo intensificou-se desde que a “Lei Pelé” “libertou” os atletas dos vínculos que os atavam às equipes (em especial o chamado “passe”, que precisava ser “comprado” junto ao clube de origem, quando o jogador se transferia para outra) nas transferências interclu). “Livres” para buscar contratos vantajosos, milhares de jovens jogadores são seduzidos pela miragem dos contratos milionários no exterior. Mas a fortuna dos que têm visibilidade na mídia é exceção, como demonstrou a Comissão Parlamentar de Inquérido (CPI) da CBF-Nike, instalada a em 2000. Um dos pontos marcantes da CPI foram os resultados de investigações sobre comércio de atletas brasileiros no futebol mundial. Uma rede de falsificação de passaportes e identidades com idade adulterada acabou emergindo. A Comissão fez recomendações à CBF, à Fifa, às autoridades brasileiras e apresentou proposta sugerindo mudanças na legislação, para prevenir tantos abusos. Os passaportes falsos repercutiram internacionalmente, aumentando o controle em vários países, como a Itália.

A denúncia reforçava os sinais de algo que continua a incomodar a humanidade: o tráfico de seres humanos. Na indústria dos lazeres, nascida e consolidada durante o século vinte, o futebol ganhou uma posição de destaque, mesmo que para isto leis internacionais sejam desrespeitadas. Segundo a Organização Internacional para Migrações (OIM), o tráfico de jogadores menores de idade é um fenômeno que precisa ser controlado. Por isso, um guia sobre formas de prevenir o tráfico de jogadores, com conselhos práticos para jovens, vem sendo distribuído aos clubes na França, para facilitar a integração dos jogadores e informá-los sobre seus direitos.

No Brasil, prossegue o drama. Oito anos depois da CPI, a Folha de S.Paulo fez uma série de reportagens denunciando a exploração de crianças por supostos agentes e clubes em Minas Gerais. Em dezembro de 2007, o jornal publicou matéria sobre a ação do Ministério Público do Trabalho do Estado, que investigou a situação de jovens aspirantes a atletas de futebol em clubes mineiros. Mais tarde, em março deste ano, a polícia civil fechou um alojamento, em Belo Horizonte, com um grupo de 22 jogadores amadores (sendo uma criança, 19 adolescentes e dois jovens de 18 anos). As famílias dos garotos pagavam até R$ 1.500 para que os filhos tivessem a oportunidade de realizar testes em clubes, o que não aconteceu para a maioria. Um agente, sem credenciamento junto à Fifa (Federação Internacional de Futebol Association) ou CBF, foi preso por aliciamente de menores e estelionato. O Conselho Tutelar da Pampulha também participou da ação.

Criam-se vínculos empregatícios para crianças a partir de oito anos de idade, embora o ECA considere crianças (portanto, protegidas do trabalho) aqueles que têm até 12 anos incompletos

Pressionados, Congresso e governo procuraram mostrar sinais de ação. Mas, a pretexto de coibir a migração descontrolada de jovens e adolescentes, propõem medidas que mercantilizam ainda mais o futebol, favorecem os clubes e não exigem destes nenhuma contrapartida social. Estão em debate alterações na Lei Pelé tais como a diminuição da idade para vincular e federar atletas. Criam-se vínculos empregatícios para crianças a partir de oito anos de idade, embora o ECA considere crianças (portanto, protegidas do trabalho) aqueles que têm até 12 anos incompletos. Segundo este critério, pela primeira vez a Federeção Paulista de Futebol e alguns clubes de São Paulo criaram novos mecanismos para lucrar com as crianças. São os campeonatos paulistas sub-11 e sub-13 anos, instituídos em janeiro.

A tentação para transformar esporte em lucro é imensa. O impulso econômico proporcionado pela prática de modalidades esportivas, somado às atividades de produção, comércio e serviços ligados direta ou indiretamente ao esporte movimentou R$ 37,1 bilhões em 2005, valor correspondente a 1,95% do PIB brasileiro.

Em nome desta receita, esquece-se a uma dimensão cultural do esporte, que torna particularmente o futebol um fenômeno social. Esta dimensão está no futebol praticado nas ruas e nos campos pelados de terra batida, revelando todo o seu potencial educativo e criador de comportamentos sociais, e que, em certa medida resiste ao entretenimento do espetáculo esportivo.

A armadilha está em enxergar só o negócio, que nega o ócio. Violenta-se, assim, a própria origem do esporte. O futebol foi organizado na Inglaterra vitoriana e incorporado nas public schools por sugestão de Thomas Arnold [1], pedagogo inglês no século XIX. Foi este sentido, educacional e comunitário, que levou o esporte “bretão” a espalhar-se pelo mundo.

O futebol inglês está entre os mais ricos do mundo. Os clubes são obrigados a manter trabalho junto às comunidades, criar centros e escolas, submeter-se a uma rede de proteção à infância

Também se esquecem exemplos bem-sucedidos, inclusive do ponto de vista financeiro, porque guiados por projetos menos imediatistas. É o caso da Inglaterra, cujos clubes de futebol estão entre os mais ricos do mundo [2]. Lá, os clubes são sociedades anônimas de capital aberto. Mas a legislação britânica é rigorosa no controle e na definição de responsabilidades sociais para as entidades — neste caso empresas esportivas.

Desde o final dos anos 1980, em resposta à violência promovida no futebol pelo chamado “hooliganismo”, a legislação obriga os clubes a manter trabalho junto às comunidades, principalmente para as crianças e jovens. Graças a isso, criaram-se, por exemplo, centros comunitários e escolas que ensinam futebol, informática e reforço escolar.

Há também uma forte rede de proteção à infância. Chamada de “The Child Protection in Sport Unit (CPSU) [3]” encarrega-se de fiscalizar e punir abusos cometidos contra crianças e adolescentes. O Child Protection é parte do The National Society for the Prevention of Cruelty to Children (NSPCC) organização fundada em 1884, antes com o nome de London Society, alterado para National Society em 1889. Os clubes de futebol são parte deste sistema e só podem receber crianças após aval do sistema, estando obrigados a seguir as orientações e condutas definidas por ele.

No Brasil, apesar dos múltiplos benefícios oferecidos pelo Estado aos clubes (a Timemania é apenas o mais recente), e da tolerância infinita diante da sonegação de impostos (em especial as contribuições previdenciárias), não há, ainda, nenhuma exigência legal que os comprometa com obrigações e responsabilidades sociais. O Estado despreza suas próprias prerrogativas e deixa de adotar medidas que defendam a juventude, ou que efetivem a relevância que o futebol pode ter em sua formação. Surge um triste híbrido de liberalismo com clientelismo. Foi um decreto-lei no Estado Novo, assinado por Getúlio Vargas em 1941 (depois convertido em Lei 3199/41) que deu aos clubes a condição de base do sistema esportivo brasileiro. Na essência, a lógica foi reforçada por nova lei, de 1975 (na ditadura militar) e pelas leis “Zico” e “Pelé”, frutos da onda neoliberal dos anos 1990.

Tudo isto gera, como conseqüência falta de controle e fiscalização efetivas sobre os clubes, permitindo, muitas vezes, que jovens deixem de estudar para ficar à disposição de possíveis negócios. Mesmo o Estatuto do Torcedor, que deveria transformar estádios em espaços seguros e confortáveis, pela lógica do entretenimento, surtiu efeitos limitados. O exemplo emblemático foi a tragédia ocorrida em 26 de novembro 2007 na Fonte Nova, na Bahia, como 7 torcedores desabando da arquibancada.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Eleições no COB

Medalha de Lata
JUCA KFOURI

A eleição clandestina no COB revela que nem mesmo a atenção com as aparências
sobrevive. Vale tudo

CARLOS NUZMAN chegou ao paraíso. Atingiu aquele ponto que só a pessoa sem nenhum problema de consciência, ou com todos, alcança: dane-se o que vão dizer de mim. O que tem a consciência tranqüila sabe que nada pode feri-lo. O que perdeu a vergonha na cara não está nem aí mais para coisa alguma, só quer desfrutar, pensem o que pensarem as pessoas, a opinião pública, o país. A velhacaria de se realizar uma eleição clandestina para mais uma reeleição dá a medida da desfaçatez, do absoluto desprezo pela imagem, até então objeto de preocupação, fosse pelo exagero no uso de perfume, fosse pelo tique nervoso de quem queria aprovação.
Inesquecível, por exemplo, um encontro do cartola com este colunista, em 1995, quando alguém maliciosamente soprou em seus ouvidos que a revista "Placar" preparava uma reportagem contra ele. Eis que, sem agendar, ele surgiu suado em minha sala para de lá sair em paz, ao ouvir que seria o primeiro a saber se fosse verdade, porque evidentemente seria procurado para dar sua versão. Pois hoje em dia nem isso. Não se envergonha ao ver a vil manobra exposta na primeira página do principal jornal da cidade onde mora, ele que preferiu usar jornais menores para publicar o edital da convocação de sua clandestina reeleição, em desobediência ao estatuto da entidade que preside. A Nuzman bastam as excelentes relações que mantém com o governo federal, seja na figura do ministro do Esporte, mais um que achou para carregar suas malas - a exemplo do cordeiro anterior-, seja com o presidente da República. Nada mesmo como um dia após o outro. Nuzman fez aquilo que caracterizava o movimento sindical peleguista que Lula combatia nos primórdios e para o qual hoje fecha os olhos porque, como se sabe, feio, em eleições, é apenas perder. Até quando o esporte brasileiro viverá desse modo? Lembremos que Nuzman quer comandar a operação Rio-16 como Ricardo Teixeira, sua filha e sua turma, comandarão a Copa-14. Só para planejar a candidatura do Rio, Lula assinou uma medida provisória que estinou R$ 85 milhões ao projeto. E já foi publicada no "Diário Oficial", do dia 1º de outubro, a isenção de ICMS para erguer e reformar estádios para a Copa, convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária com o Distrito Federal e todos os Estados. Tudo, portanto, feito com o seu, o meu, o nosso suado dinheirinho. Mas, em vez de indignação popular, o que se vê é o presidente do STF, Gilmar Mendes, receber Teixeira e pedir a ele apoio da CBF para o programa de recuperação de presidiários do Conselho Nacional de Justiça, iniciativa, é claro, prontamente abraçada pelo cartola. E não por solidariedade ou porque o seguro morreu de velho. Mas por real interesse por quem não conseguiu escapar das grades.
Como se vê, ainda, Lula receber Nuzman, ser bajulado por ele com os mesmos elogios já feitos a FHC ("O presidente que mais fez e fará pelo esporte") sem que se faça menção ao relatório do TCU sobre a gastança do Pan-2007.
Bom domingo. Vote bem.